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Teste em Voo – Piper PA-34-200T Seneca II

por Micael

Piper Seneca EJ

É difícil enumerar a quantidade de missões e aplicações que podem ser designadas ao Piper PA-34 Seneca. Ao longo de mais de cinquenta anos de produção, o bimotor leve a pistão mais famoso do mundo colecionou e coleciona admiradores desde sua primeira versão, por suas características técnicas, de facilidade de operação e segurança, isso sem contar na qualidade de seu voo muito macio e baixo custo operacional.

Certificado sob a PART 23 da FAA em 1971, derivando do Piper Cherokee Six (Saratoga), a primeira versão do pequeno bimotor mostrou-se uma excelente opção ao já conhecido Piper PA-30 Twin Comanche, que, sendo produzido desde os anos 60, dava sinais de cansaço e desatualização.

Com o início da produção, o Seneca I atiçava a criatividade nos mais diferentes tipos de emprego para a aeronave. Porém, esbaravam na questão performance e peso máximo de decolagem, críticas para certas missões.

PA-34-200T PR-EOJ: interessante opção para táxi aéreo de baixo custo

Foi em 1975 que a Piper lançou o PA-34-200T, batizado de Seneca II. Este sim, com novos motores de 200HP turboalimentados, aumentou ainda mais a aplicabilidade da nave, tanto no exterior quanto em território nacional, adaptando-se bem ao nosso clima e condições das nossas pistas. Neste mesmo ano o Seneca passou a ser produzido também no Brasil sob licença da Piper, sendo rebatizado como EMB-810C.
 
Dentre os principais incrementos que esta nova versão recebeu, destacam-se o maior peso máximo de decolagem (2073kg), desenho mais aerodinâmico do capô dos motores, novos escapamentos, anti-servo no rudder, ailerons maiores, novo interior, etc. Além disso, segundo a fábrica, houve melhorias em relação ao seu irmão mais velho, o Seneca I. Agora, ele ficou mais rápido nas subidas, com uma rate of climb de 1550 fpm, velocidade média de até 166kt, velocidade de estol (com trens e flapes) de 63kt, teto máximo de 25.000 pés. Além disso, os tanques tem capacidade máxima utilizável de 465 litros, com autonomia de até 870nm.

Tais melhorias consolidou o Seneca no Brasil e no mundo, sendo a versão mais vendida dentre as cinco produzidas. Em terras tupiniquins, foram fabricados mais de 450 unidades, e mais de 2000, pela Piper.

 

Veja também esta matéria em vídeo:

https://youtu.be/htGhgY8hERo

O SENECA COMO TAXI AÉREO

O PT-EOJ que vamos avaliar é um PA-34-200T, ano 1977, fabricado pela Piper, pertencente à EJ Taxi Aéreo, braço executivo da famosa escola de nome homônimo. A aeronave somou-se a um Cessna CitationJet e tornou-se uma interessante opção a um serviço de transporte aéreo mais em conta, além de poder operar em uma gama ainda maior de pistas, ideal para quem quer realizar seu primeiro voo nesse tipo de serviço com menor custo.

Meu contato inicial com o EOJ deu-se no pátio da empresa em Jundiaí (SP), onde fomos muito bem recebidos pela equipe da empresa, liderada pelo Diretor de Operações Gustavo Gorni. A primeira impressão que tive da aeronave foi muito interessante, pois encontrei uma máquina muito bem conservada, com um esquema de pintura moderno e feliz, com duas faixas azuis claras e escuras, nascendo no capô do motor e terminando num interessante degradê na cauda, onde ostenta a logotipo do grupo. O desenho do avião – extremamente conhecido do grande público aeronáutico – continuou praticamente igual desde a primeira versão: nariz protundente, motores bem avançados, seção superior reta e com leve caída e estabilizador vertical generoso. Somado ao desenho, é impossível não enxergar o pneu dianteiro grande e robusto, praticamente um off-road, pensado justamente para operar também em pistas de terra.

No interior, o couro cinza-claro dos bancos e forração deixa o ambiente agradável, gerando uma sensação de amplitude, fugindo um pouco do tradicional bege. Na região dos passageiros, a configuração club-seat (frente a frente) permite um pouco mais de espaço para os joelhos, porém requer que os quatro ocupantes entrem em um acordo aonde ficarão os pés, pois sobra pouco espaço na região do piso naquela área. 

Interior do Seneca II: diversas opções de personalização para o cliente

Além disso, o espaço para a cabeça fica um pouco mais comprometido na fila mais ao fundo do Seneca (especialmente se o ocupante tiver mais de 1,80m de altura, como no meu caso), devido a inclinação para baixo do teto em direção à cauda. Por fim, nessa sessão também encontramos uma prática mesinha retrátil, saídas de ar no teto, um cooler entre os bancos e apoios de braços nas portas, com acabamento imitando madeira, com práticas saídas USB, indispensáveis em aeronaves que tenham a proposta de serem táxi aéreo.    

Cabine de passageiros: espaço razoável para até 4 passageiros

No posto de pilotagem, encontramos o padrão nos demais Senecas: bom espaço para pernas e cabeça, saídas de ar no teto, a tradicional vent window acima do painel de luzes/magnetos (usada para comunicação externa e ventilação) e bancos em couro, na mesma padronagem dos passageiros. O painel, disposto mais horizontalmente (diferente das gerações mais recentes, com instrumentos na vertical), é bastante conhecido entre pilotos, tendo instrumentos analógicos e digitais, instalados pela empresa.

Painel do PA-34-200T: mesclagem de instrumentos analógicos e digitais

Dentre essas modificações destacam-se um conveniente EFD Evolution 1000 de 1007 por 503px, com horizonte artificial na parte superior e HSI na inferior, que aumenta consideravelmente a consciência situacional, especialmente em voos IFR.

Além disso, foi instalado no EOJ um radar meteorológico Bendix, uma caixa de áudio GMA340, um GNS430/W e um transponder GTX327, todos da Garmin. Piano de manetes, alavanca e indicação de trem de pouso, flapes estilo “freio de mão”, pedais com a logo da Piper, compensadores e seletoras de tanques estão todos lá, no mesmo padrão Seneca I e II de sempre.

 

O SENECA II EM VOO

Avião checado, abastecido, voo notificado junto ao ATC, e estamos prontos para partir. Quem me acompanhou no voo foi o piloto Vinícius Coletto, que brifou-me sobre a missão a ser realizada e os procedimentos previstos no SOP (Standard Operating Procedures) da EJ Taxi Aéreo. Acionamento simples e rápido em ambos motores, reporte realizado na frequência em 118,75Mhz (Torre Jundiaí), taxi lento até a RWY18, briefing de emergência feito (com especial atenção à manutenção da velocidade Vyse, ou seja, na blue line), alinhamento na pista e estamos prontos para a decolagem.

Aplicamos a potência de decolagem progressivamente até chegarmos a 35pol de manifold pressure (com limitante de 39,8 pol, pois com 40 pol entra o overboost), parâmetros de motor all green, liberamos os freios e o PR-EOJ ganha velocidade rapidamente. Praticamente nenhuma correção ou ajuste nas mantes após o início da corrida, algo muito comum que fazemos em outros Senecas II, demonstrando o quão bem afinado está o Echo-Oscar-Juliet. Fiquei assaz impressionado com a saúde do avião, que precisou pouco mais de 400m para alçar voo, com três a bordo e mais de meio tanque de combustível. Bem verdade, parecia que estávamos em um Seneca III…

Livramos o circuito de SBJD e seguimos com proa do Portão Itupeva, já nivelado em 3,800ft. Aproveitei o translado para recordar-me da boa qualidade de voo do avião da Piper. Executei algumas coordenações de 1° tipo, estabilidade dinâmica longitudinal (onde o avião denunciou mais uma vez seu nariz bastante pesado, recuperando após quatro ciclos, com tendência de nose down), voo lento e curvas de grande, sem qualquer tendência do avião escorregar para dentro da curva.

Seneca II: docilidade e estabilidade em voo, característico da família PA-34

O que percebe-se em voo é o que já havia notado desde à época que realizei meus treinamentos MLTE: embora tenha comandos bastante pesados, manobra-lo requer poucos comandos e boa previsibilidade, ou seja, não se comporta como em outros aviões mais antigos até da própria fabricante que dá a impressão de estar pilotando uma VW Kombi com folga na direção; os movimentos são suaves, e trima-lo é uma tarefa bastante fácil – isto, claro, se o compensador elétrico estiver operacional, que é no nosso caso.

No retorno à Jundiaí, cruzamos o campo a 4000 ft, reduzindo nossa velocidade para 100kt na perna-do-vento da pista 18, onde arriamos o flape no primeiro dente. Aqui, já com a velocidade reduzida para 90kt, baixamos o flape 2, comandamos gear down, cheques pré-pouso e giramos base. Na final, o Senecão mante-se estável na rampa visual, sem flutuações ou grandes correções, mantendo os 90 nós durante toda a aproximação, realizando um toque seguro e suave, embora haja a necessidade de fazer força no braço para manter o narigão na atitude de toque, na hora do flare. Saímos pela saída rápida, autorizados pela Torre Jundiaí a prosseguir até o pátio da EJ, onde calamos os dois Teledyne Continental TSIO-360 na mistura.  

 

CONCLUSÃO

Embora haja alguns aviadores que nutrem um mito ou até certo ponto preconceito contra o Seneca (especialmente sua primeira versão), fazendo comparações contra outros concorrentes, é fato e inegável o sucesso desse projeto, sobretudo por ser uma plataforma multiuso, especialmente como aeronave treinadora.

Curioso notar, inclusive, que muitos que tecem essa fábula habilitou-se pilotos multimotores justamente num Seneca! Assim, cai por terra essa fábula e o que resta é justamente o fato de que essa linha de aeronaves contribuiu e continua contribuindo para o desenvolvimento do país e do mundo, por todas suas características e por ser uma ótima opção na sua classe como aeronave empreendedora, aliando segurança, baixo investimento de aquisição, reduzido custo operacional, facilidade de manutenção e operação.

A EJ percebeu bem essa ideia, e a pôs em prática com bons resultados, e quem ganha, no fim, é o consumidor final.

 

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Micael Rocha foi instrutor de voo por quatro anos, é checador em aeroclubes e CIACs, voou C525, C525B e C208B Caravan em táxis aéreos e voa Cirrus SR22 desde 2013. 
@aeroereview

 

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Autor: Micael Rocha

Micael Rocha foi instrutor de voo por quatro anos, é copiloto de CJ1, CJ3 e C208B Caravan e voa aeronaves Cirrus SR22 desde 2013. @aeroereview

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