Os aviões do fim do mundo da Rússia e Estados Unidos

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O E-4B Nightwatch será o Pentágono Voador no caso de uma guerra nuclear. Foto: USAF.

A empreitada militar da Rússia contra a Ucrânia já completou um mês e uma semana na quinta-feira (30). A enorme tensão na Europa trouxe consigo inúmeras discussões sobre a Terceira Guerra Mundial e o possível uso e armas nucleares em um hipotético conflito entre a Rússia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte. 

Se isso acontecesse – algo que teria as consequências mais catastróficas possíveis à humanidade -, um certo tipo de aeronave teria um papel fundamental no conflito nuclear. Não estamos falando de caças ou bombardeiros, mas sim dos Postos de Comando Aerotransportados, os chamados “Aviões do Fim do Mundo.”

Ilyushin Il-80, o centro de comando aerotransportado conhecido como “Avião do Fim do Mundo” da Rússia. Foto: Dmitry Terekhov – Wikimedia.

A missão destas aeronaves é manter uma linha de comando entre líderes de estado e comandantes de estado-maior com os militares responsáveis por lançar as milhares de armas nucleares que os dois países possuem.

Estes aviões são verdadeiras salas de guerra voadoras, lotadas de rádios, antenas, datalinks e sistemas de comunicação segura e via satélite, para garantir que o presidente e sua equipe ainda possam responder ataques nucleares. 

Moscou e Washington possuem dois modelos para a missão. As Forças Aeroespaciais Russas operam o Ilyushin Il-80 Maxdome, enquanto a Força Aérea dos EUA possui o E-4B Nightwatch fabricado pela Boeing. 

Boeing E-4B Nightwatch 

O mais famoso “avião do juízo final”, o E-4B Nightwatch é o posto de comando aéreo avançado da Força Aérea dos EUA. Em caso de ataque nuclear, é dele que os líderes dos EUA e membros da Autoridade Nacional de Comando (NCA) irão coordenar os movimentos de tropas e, principalmente, empregar os mísseis nucleares do arsenal estadunidense. 

Foto: Senior Master Sgt. Adrian Cadiz/USAF.

O E-4 surgiu na década de 1970 como E-4A para substituir o EC-135J, que tinha a mesma missão. A aeronave é baseada no jato de passageiros 747-200 Jumbo, assim como VC-25, mais conhecido por Força Aérea Um, sendo comum a confusão entre aos dois modelos. Ao longo do tempo as aeronaves foram atualizadas e receberam a designação E-4B, usada até hoje. 

A aeronave foi amplamente modificada, recebendo uma série de instrumentos como rádios VHF, UHF, SHF, VLF, enlace de dados, comunicação direta e segura, linhas de central telefônica, computadores e equipamentos de processamento de dados, e comunicação via satélite. A aeronave pode receber uma tripulação completa de 112 militares – a maior em qualquer avião da USAF – além dos outros passageiros.

O Nightwatch também recebeu uma grande antena no dorso, logo atrás do cockpit. Todo o sistema de ar condicionado recebeu filtros QBRN (Químico, Biológico, Radiológico e Nuclear) e a aeronave é blindada contra pulsos eletromagnéticos, além de possuir uma suíte de autoproteção com chaffs e flares. O E-4B também é capaz de ser reabastecido em voo, podendo voar por dias. 

E-4B sendo reabastecido por um KC-10 Extender. Foto: USAF.

Internamente, o E-4 é dividido entre o cockpit, sala de descanso para a tripulação, sala de conferência, briefing, sala da NCA (onde ficam o presidente, sua equipe e comandantes de estado maior), sala da equipe de operações, sala de comando e controle de comunicações, seção de controle técnico e mais uma área de descanso, no final da fuselagem. É na área de controle técnico que os militares da USAF passam os comandos de estado maior e poder executivo para os operadores dos mísseis. 

 

Atualmente a USAF possui quatro E-4B Nightwatch, todos operados pelo 1º Esquadrão de Controle de Comando Aerotransportado, na Base Aérea de Offutt, Nebraska. Apesar de sua importância, o E-4B é baseado no antigo airframe do 747, algo que contribui para o fato de ser o avião com maior custo de hora voada na frota dos EUA, custando quase US$ 160.000 por cada hora de voo. 

Além do posto de comando para operações militares, o E-4B também pode prestar missões de apoio à Agência Federal de Gestão de Emergências (FEMA). 

A USAF já está buscando uma aeronave para se tornar o novo Nightwatch, pelo projeto Survivable Airborne Operations Center (SAOC). 

Ilyushin Il-80 Maxdome 

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Ilyushin Il-80 nas cores da Aeroflot, mas com matrícula militar russa. Foto: Kirill Naumenko (CC BY-SA 3.0)

O Nightwatch de Moscou é o quadrijato Il-80. Enquanto as informações sobre o E-4 são vastas, o mesmo não pode ser dito sobre o jato russo. O Il-80 é chamado de Maxdome pela OTAN e é baseado no jato de passageiros Il-86.

Algumas fontes apontam que a aeronave também é designada como Il-86VKP e Il-87, além de ser chamada de Camber (designação da OTAN para o Il-86). Enquanto a OTAN o chama de Maxdome, os russos o apelidaram de Aimak, que significa clã em Mongol. 

Seu projeto surgiu na década de 1980 como uma resposta à necessidade da então União Soviética para esse tipo de aeronave. No entanto, a crise e posterior queda da URSS atrasou o projeto. A aeronave fez seu primeiro 1985, começou a entrar em operação em 1988 e foi registrada por fotógrafos ocidentais pela primeira vez em 1992. 

 

Assim como sua contraparte norte-americana, o Il-86 também foi severamente modificado para se tornar um posto de comando voador. A maior diferença visual está na “corcova”, instalada atrás do cockpit – outro ponto em comum com o E-4B – que abriga um conjunto de antenas de comunicação via satélite.

O dorso também abriga uma série de antenas de várias formas e funções, incluindo uma de VLF para comunicação com os submarinos lançadores de mísseis balísticos (SSBN), como os da classe Borei e Delta III e IV.

Il-80 sobrevoando Moscou, escoltado por caças MiG-29 Fulcrum. Foto Leonid Faerberg.

Para aumentar a proteção contra radiação, todas as janelas dos passageiros foram retiradas. Apenas duas portas permanecem na aeronave, no lado esquerdo frontal e direito traseiro. O sistema de ar-condicionado também recebeu filtros QBRN. 

A aeronave também recebeu dois pods com geradores elétricos instalados nas duas asas, ao lado dos motores, cada um medindo aproximadamente 9,5 metros de comprimento por 1,3 metro de diâmetro. Os dois geradores alimentam a enorme quantidade de sistemas – estima-se que são 300 unidades adicionais – instalados no avião. 

Foto: Artem Katranzhi (CC BY-SA 2.0)

Não se têm detalhes do interior do Il-80, mas especula-se que a configuração seja similar ao próprio E-4B. Como o E-4, o Il-80 também pode ser reabastecido em voo: o jato russo possui uma sonda instalada no lado esquerdo da fuselagem. 

A Rússia possui quatro Il-80, com matrículas RA-86146 a RA-86149. As aeronaves são operadas pela 8ª Divisão de Aviação de Propósitos Especiais das Forças Aeroespaciais Russas, tendo como sede a Base Aérea de Chkalovsky, a 30 Km ao nordeste de Moscou. Os Il-80 também ostentam a mesma pintura usada pelos Il-86 na companhia aérea Aeroflot.

Foto: Alex Beltyukov – RuSpotters Team (CC BY-SA 3.0)

Da mesma forma que os EUA buscam um substituto para o Nightwatch, a Rússia também quer um novo Maxdome e este poderia ser baseado no Il-96-400M

 

Outros modelos

Além do Il-80 e E-4B, outras duas aeronaves teriam um papel importante no infeliz caso de uma guerra nuclear.

E-6B Mercury. Foto: US Navy.

A Marinha dos EUA possui o E-6B Mercury baseado no antigo 707. A aeronave é um nó de comunicações entre o E-4, o Pentágono e os submarinos lançadores de mísseis balísticos da US Navy, e também pode repassar ordens aos silos ICBM LGM-130 Minuteman da Força Aérea. A US Navy possui 16 E-6B em operação. Estes também deverão ser substituídos daqui alguns anos, também pelo programa SAOC.

Já a Rússia possui dois Il-76VKP, convertidos a partir do cargueiro Il-76 Candid. O sufixo VKP significa Vozdooshniy Fomanndniy Poonkt, literalmente Posto de Comando Aéreo. A aeronave tem praticamente as mesmas funções do próprio Il-80 e também é facilmente reconhecido através de modificações. Nesse caso, o cargueiro militar recebeu um enorme domo para sistemas de comunicação por satélite, enquanto o característico nariz de vidro foi coberto.

Il-76VKp Rússia nuclear

Os dois Il-76VKP estacionados em Chkalovsky, ao lado dos Il-80. Foto: Yevgeny Volkov (CC BY 3.0)

Apenas duas aeronaves foram convertidas na década de 1980 e ambas foram repassadas à Base Aérea de Chkalovsky. Acredita-se que apenas uma unidade, matrícula RA-76450, esteja em operação. A outra aeronave, matrícula RA-76451, foi vista voando pela última vez em maio de 2015. 

 

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Estudante de Jornalismo na UFRGS, spotter e entusiasta de aviação militar.